RETROSPECTIVA 2015 DO TUDO CULTURAL - A ARROGÂNCIA DAS EDITORAS



Crônica de Gustavo do Carmo

Você coloca um ponto final no seu sonhado romance e... aí depende. Se você for famoso ou amigo íntimo, parente ou cônjugue de algum editor de editora, a obra já estará nas livrarias em no máximo um mês. Mas se for um mero desconhecido e estiver querendo publicar o seu primeiro livro vai ter que esperar muito mais tempo... para ter uma resposta. E provavelmente negativa.

As editoras, com a velha desculpa de que só investem naqueles autores que dão lucro certo, só aceitam facilmente os originais (como são chamados os rascunhos de texto dos escritores) de gente famosa e amigos.

Para dizer que são democráticas elas aceitam originais de novos autores. Mas vêm impondo condições cada vez mais absurdas e assumem na cara-de-pau que não são obrigadas a responder.

A maioria só aceita originais impressos. Se o seu livro tiver muitas páginas você pode gastar meia resma de papel e meio cartucho de tinta, além de pagar o envio pelo correio (caso a editora fique em outra cidade), para não ter resposta ou receber uma carta com palavras falsamente elogiáveis e lamentáveis (que contêm lamentação, não apenas no sentido de revoltantes). Nem sequer se dão ao trabalho de devolver. Só de destruir para você quando não aceita.

Revoltantes mesmo são outras exigências que fazem quando algumas aceitam pela internet: pedem preenchimento de formulário com resumo da história (se é um livro com 20 contos eu tenho que fazer resumo dos 20? E se pedem resumo é porque não estão com o mínimo interesse de ler), público-alvo do livro, texto em fonte Times New Roman tamanho 12 e duplo espaço. Teve até uma que pediu para descrever o que você espera do livro, pergunta típica de empresa de recursos humanos.

Uma vez tive um trabalhão para preencher o burocrático formulário de uma dessas e o navegador atualizou-se automaticamente. Tive que começar tudo de novo. Recomecei só em outro dia. Meses depois a editora aprovou os originais. Mas quis me cobrar 13 mil reais. Na verdade, era o custo da compra de 500 livros. Recusei.

Outra exigiu o formulário e os originais em PDF. A sorte é que um dos meus originais estava no arquivo desejado, mas porque eu só converti para vender numa editora virtual. Mandei o outro em Word mesmo, com a maior bronca no e-mail.

Concordo com as editoras que pedem o registro na Biblioteca Nacional. Só não concordo com as editoras que usam o perigo de plágio para justificar o não recebimento de originais por e-mail. Ora, se o texto está registrado, qual o perigo?

Impresso ou não, quem vai plagiar, vai plagiar se não estiver registrado. E se estiver copia a ideia, já que ideia não caracteriza plágio. E não duvido nada que muitas editoras usam essas ideias para os seus autores apadrinhados.

Quando eu tentava publicar o meu primeiro livro até aceitava esses processos burocráticos e arrogantes de avaliação de novos originais. Era muito ingênuo. Já imprimi uma resma inteira de papel, gastei um cartucho inteiro para imprimir duas cópias do meu primeiro romance e mandei para duas editoras (uma era do Rio, mas eu estava em Cabo Frio), pagando duas taxas de Sedex. Depois mandei para uma terceira editora.  A de São Paulo (Companhia das Letras) não me respondeu.  Uma do Rio (Record) me mandou aquela carta com palavras lamentáveis e outra daqui (Rocco) me sugeriu ir buscar pessoalmente. Fui até o Cosme Velho e encontrei o meu original intocado, sem qualquer anotação. Se eu fosse fazer um exame de impressão digital, acho que iria encontrar só as minhas ali.

Poucos anos depois, agora com uma coletânea de contos, fui pessoalmente à Rocco, já em outra sede: um escritório dentro de um moderno arranha-céu na rua Presidente Wilson. Enfrentei um vento forte vindo da região do Castelo na longa e demorada fila para pegar o crachá de acesso ao edifício. Lá em cima, depois de uns dez minutos de espera, ouvi que eles não publicavam contos. Meses depois ela publicou uma coletânea de contos da já famosa Patrícia Melo.

Já me decepcionei com as duas editoras que publicaram os meus livros. Uma de São Paulo até se esforçou para divulgar e distribuí-lo, mas revisou mal e nenhum dos sócios se deu ao trabalho de vir ao Rio. Até que vendeu razoavelmente. A outra, carioca, sequer deu entrada no ISBN, me entregou os convites para o lançamento na véspera do evento, não distribuiu, fez uma revisão péssima e ainda se fez de ofendida quando reclamei.

As editoras que cobram para publicar também têm o seu exemplo de arrogância. Estava quase acertando a publicação do meu livro de contos com uma dessas até eu questionar o alto preço, não da impressão, mas da divulgação e da conversão para o formato digital. Estava sendo atendido por uma simpática funcionária de relações públicas.

Exigi um bom serviço, reclamei nominalmente da editora que publicou o meu segundo livro e brinquei dizendo que, pelo preço da assessoria, eu merecia uma entrevista no programa da Fátima Bernardes, mas disse sério que até eu faria a conversão. O editor (ex-sócio da editora que publicou o meu primeiro livro) tomou a frente da negociação para me responder com sermões, como se estivesse dando um esporro em um subalterno fofoqueiro e não conversando com um potencial cliente. Disse que eu não valorizo os profissionais, exigiu que eu não mencionasse nomes de outras empresas e esclareceu (como se eu tivesse pedido o esclarecimento) que a Fátima só divulga livros por interesse da produção.

Se ele já trata um cliente desta forma antes de assinar o contrato, imaginei como seria a edição do meu livro. Cancelei a negociação, falei umas verdades para ele sobre a outra editora e que o meu dinheiro não é lixo, bloqueei essa nova editora no Facebook e só não o mandei para aquele lugar porque eu me controlei. E danem-se aqueles que acharem que eu fui infantil ou que estou sendo infantil ao escrever esta crônica. Não aguento mais ver artistas e amigos dos editores fazendo sucesso com os seus livros bem divulgados. Desisti. Não  me humilho mais para pedir editora, mas faço questão de humilhar editora arrogante. 

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