BABY

Foto: Cena da novela Fina Estampa (Rede Globo)


Conto de Gustavo do Carmo, baseado na canção homônima de Rita Lee, mais famosa na voz de Gal Costa.

Chegou cansada de mais uma viagem de férias na Europa. Ficou um mês longe de casa. Sem dar notícias, sem ligar para ninguém. A não ser quando desembarcou no Brasil, pedindo para ser recebida com um Dry Martini. No dia seguinte, voltaria ao batente como editora de uma revista de moda. O motorista subiu para o quarto com as suas malas.

Depois de ajudar o colega serviçal, a empregada, Baby, levou o Dry Martini. Ao chegar à sala, viu-a se refestelando no sofá de couro branco. Após servir o drinque, aproveitou para lhe contar, com a sua voz nordestina estridente o que aconteceu em sua ausência:

— Dona Lira, em primeiro lugar: que bom ter a senhora de volta!
— Obrigada, Baby.
— Mas a senhora precisa saber da piscina, da margarina, da Carolina, da gasolina.
— Calma, Baby! Uma coisa de cada vez.
— Tudo bem, Dona Lira. Vou falar. A piscina está com vazamento de novo.
—  E você não mandou o Caetano consertar?
— Mandei. Mas ele disse que só pode vir na semana que vem.
— O que mais você ia dizer?
— A margarina suíça que você deixou na geladeira estragou.
— Isso é o de menos. Eu trouxe mais de Genebra.
— E a Carolina?
— Assumiu que é lésbica e vai se casar com a Daniela, colega de faculdade dela.
— E a gasolina?
— Aumentou de preço de novo.

Lira ficou calada. Não esboçou nenhum comentário sobre o que aconteceu em sua casa em sua ausência. A empregada Baby, preocupada, questionou:

— Credo, Dona Lira, a piscina deu vazamento, a sua margarina predileta estragou, a sua filha virou lésbica, a gasolina aumentou de preço e a senhora não fala nada?
— Baby, Baby! Eu sei que é assim! Gritou impaciente.
— Calma, Dona Lira, quanto estresse. A senhora precisa tomar um sorvete na lanchonete, andar com a gente...
— Com a gente quem?
— Com as minhas colegas de serviço. A Luzinete, a Ivonete e eu.
— Desculpa o preconceito, Baby... mas você acha que eu vou ficar saindo com empregada?
— Está bem, Dona Lira. Mas acho que você precisa me ver de perto. E ouvir aquela canção do Roberto.
— Baby, há quanto tempo você anda me cantando, hein?
— Eu, hein, Dona Lira! Eu não tô cantando ninguém, não! Assim a senhora até me ofende!
— Está bem, Baby! Desculpa. Lira deu um sorriso maroto. Mas eu vou ficar ouvindo música do Roberto Carlos? Você precisa aprender inglês. Precisa aprender o que eu sei. E o que eu não sei mais. Como é que você vai?
— Não sei, Dona Lira.
— Comigo vai tudo azul. Contigo vai tudo em paz? Vivemos na melhor cidade da América do Sul, que é o Rio de Janeiro. Você precisa, você precisa...

Lira se aproxima sensualmente da emprega Baby, abre o paletó do terninho que vestia. Por baixo, a sua camisa dizia: Baby, Baby... I Love You. Patroa e empregada se beijaram apaixonadamente. 


Baby tinha colocado Viagra e calmante no Dry Martini da patroa. Só não foi demitida porque Lira estava apaixonada e tinha embarcado em Genebra, na volta para o Brasil, premeditadamente vestindo a camisa com a declaração de amor à empregada. 

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