Matheus estava divorciado. Havia
passado cinco meses desde que ele e a ex-mulher assinaram os papéis e o máximo
que ele fazia era passar no mercado na volta do trabalho. Morava agora em um
pequeno apartamento alugado.
Ele estava no supermercado com a
cesta de compras vazia. Parou em frente de um desses displays com CDs e DVDs
baratos, próximos dos caixas. Pegou o celular e ligou para o seu amigo José. Um
dos únicos que ficara do seu lado na separação.
“Alô?”, disse José na outra linha.
Matheus não disse nada. Ficou ali
parado, encarando aqueles filmes horríveis que ninguém quer comprar.
“Matheus? Você tá aí?”
Demorou mais uns cinco segundos
até ele responder.
“Hã... Sim, tô sim. E aí, cara,
como é que você está?”
“Humm... Tudo bem. É... Tudo bem. E você?”
“Tudo certo...”
Mais um momento de silêncio.
“Escuta, José... O que você vai
fazer hoje?”
“Acho que nada. Ia ficar aqui em
casa mesmo. A Marina assiste a novela, então...”
“Você não quer vir aqui em casa
assistir alguma coisa?”
O amigo hesitou antes de
responder.
“Ok... Vou sim. Quer que eu leve
alguma coisa?”
“Não, não precisa não.”
“Então tá, até daqui a pouco.”
“Até...”
Ele desligou o celular e
continuou ali, na frente do caixa, tentando descobrir quais daqueles filmes
eram os menos ruins.
José disse para a sua mulher:
“Você sabe como é que é, ele está separado, sozinho...”, quando ela disse que
não queria ver a novela sozinha. Ele não sabia quando havia dado a entender que
gostava de novela, mas o estrago já estava feito. No fim ela cedeu. “É mesmo, né? Coitado dele. Vai lá fazer
companhia.”
Antes de assistir o filme,
Matheus colocou duas lasanhas no microondas para esquentar. Enquanto comiam, um
silêncio tomou conta do ar. Matheus já não tinha o que falar, pois usara todas
as perguntas gerais: “Como está a patroa? E o trabalho? O Juninho está bem
também? Você quer a lasanha de queijo ou a de carne? Quer vinho? Ah é, você vai
dirigir...”.
Já José – que tinha feito mais ou
menos as mesmas perguntas – só conseguia pensar em perguntar com estava
passando agora, depois do divórcio. Mas achou melhor não tocar no assunto.
Já estavam quase na metade da
lasanha quando Matheus quebrou o gelo.
“Já te contei a história de
quando o meu padrinho quebrou o meu triciclo que ele mesmo tinha me dado de
presente?”
“Não, acho que não...”
Matheus acabara de falar e
percebera que essa era a história toda. O padrinho dele foi brincar com ele,
sentou em cima do triciclo, quebrou, e só.
O filme não foi melhor do que o
jantar. José não reclamou. A Marina
estava certa. Coitado dele, pensou, Está
um caco.
Mas no fim das contas, até que
foi bom. Pelo menos Matheus não tomou meia garrafa de vinho e chorou olhando as
fotos do álbum de casamento, que ele não sabia como tinha parado ali em uma de
suas caixas da mudança.
Conto de Lucas Beça
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